abril 16, 2009

Meus portugueses

A partir da metade do século XIX a imigração portuguesa no Brasil teve caráter quase que exclusivamente urbano, em sua maioria, extremamente pobres, vinham em família, com grande número de mulheres e crianças e ao chegar procuravam parentes ou se instalavam em pequenos cortiços. A maior parte deles dedicou-se ao comércio, pequenas vendas e padarias, e chegaram a dominar essas atividades em várias regiões; outros, tornaram-se operários nas nascentes indústrias brasileiras. Nas origens das formações modernas de alguns bairros da Zona Norte do Rio de Janeiro, atualmente conhecidos como Piedade, Encantado, Higienópolis, Del Castilho e outros, lotes foram vendidos a esses imigrantes; alguns mais abastados adquiriram terrenos nas partes baixas, enquanto que os mais pobres nas partes altas onde os lotes eram mais baratos, o que indicia os primórdios de uma favelização diferente da que se conhece nos dia atuais. Historicamente, alguns dados são utilizados para explicar esse fenômeno, e um deles é justamente a extinção dos cortiços e a necessidade de buscar moradia em lugares economicamente acessíveis.Por volta de 1906, quando mais de cento e trinta mil portugueses já viviam no Rio de Janeiro (16% da população da época), se iniciou a minha família paterna. Meu avô chegou ao Brasil solteiro e casou-se com a filha de portugueses já estabelecidos na Rua Miguel Cardoso, no bairro do Encantado, uma rua alta “de ladeira” onde várias casas de cômodos eram divididas por famílias portugueses e brasileiras em condições financeiras similares.




Meu pai, o segundo de três irmãos, nasceu em 1927, quando o Brasil já não precisava mais da mão de obra imigrante para trabalhar na agricultura e nas fábricas, pois a população brasileira, em grande parte aumentada por conta dos inúmeros casamentos interraciais, já supria a demanda. Casado com uma vizinha, minha amada mãe, sua primeira namorada, morena filha de uma negra linda e de um filho de portugueses;



constituiu família de dois filhos - eu e meu moreno e querido irmão, miscigenação pura - que viveram sua infância e adolescência nessas cercanias curtindo carnaval e festa junina de rua, sendo “vigiados” e cuidados por mil olhos amigos do “Branco”, meu pai, e “Pardal”, meu tio, rapazes outrora “danadinhos” e à época respeitáveis senhores de família...

Copacabana

No finalzinho dos anos 50 e principalmente entre os anos 60 e 70, o bairro de Copacabana já estava começando a ficar saturado de prédios de apartamentos quando foram liberados os gabaritos pra construções de 12 andares prejudicando a visão do contorno das montanhas. Foi esse irresístivel e desenfreado desejo de viver na “Princesinha do Mar” - cantada em verso e prosa e samba... - que também propiciou o surgimento dos primeiros edifícios de apartamentos conjugados, dimensões mínimas, conhecidos como “JK” (janela e kitchnett = quitinete), mas que o humor popular associou as iniciais do então presidente que viabilizou o inicio desse “boom” imobiliário que acabou transformando Copacabana numa verdadeira selva de prédios que se reproduziram vertiginosa e desordenadamente.

Foi aí que, do alto de qualquer um desses prédios, num ensolarado dia do ano de 1957, o meu sogro tentou assistir, de cabeça para baixo, ao desfile dos presidentes de Portugal, General Craveiro Lopes, e do Brasil, Juscelino Kubsticheck, pela Praia de Copacabana. Coisas da juventude! ...

Praça Paris

Em algum dia do ano de 1952, moradoras do Encantado, bairro de subúrbio carioca que foi batizado assim por conta de uma lenda que fala de um charreteiro que sumiu como que por encanto nas águas então límpidas do Rio Faria, minha mãe e sua irmã pegaram um dos 16 lotações da Empresa de Lotações Estrela Ltda, inaugurada em 20 de julho de 1950, e que explorava a linha Encantado - Praça Paris e foram passear...


Isto aconteceu, é claro, bem antes que a Praça Paris desaparecesse em 23 de junho de 1970 a partir do cravamento da primeira estaca das obras da construção do metrô. A praça, localizada no bairro da Glória, foi construída durante a gestão do então Prefeito Antônio Prado Júnior, entre 1926 e 1930, com projeto do urbanista francês Alfredo Agache; seu traçado reproduzia a elegância de um jardim parisiense e abrigava obras de arte e esculturas. Entre essas obras, uma estátua eqüestre do Marechal Deodoro da Fonseca, em bronze. Foi restaurada e reinaugurada em 1992, agora cercada por grades, visando a sua preservação.

Meu bisavô materno

Contestar é genético... Em 1940, meu bisavô João Ramos dirigiu-se a redação do jornal Diário de Notícias para denunciar os baixos valores atribuídos as aposentadorias dos trabalhadores da área têxtil. Esses trabalhadores colaboraram no crescimento do primeiro surto industrial brasileiro iniciado em 1880.




A importância desse surto para o Rio de Janeiro é tamanha que, das indústrias de fiação e tecidos de algodão do então Distrito Federal que participaram da Exposição Nacional de 1908, todas haviam sido fundadas até o ano de 1891.Algumas fiações desta época no Rio de Janeiro são: Tecidos Aliança, Confiança Industrial, Tecidos Carioca, Tecidos Corcovado, a Fábrica São Cristóvão e a Fábrica Cruzeiro.E, em Petropólis (origem da minha, graças a Deus, miscigenada família)a Imperial Fábrica de Tecidos São Pedro de Alcântara e a Fábrica de Tecidos Cometa, onde trabalhou o meu bisavô e onde hoje só existem as ruínas das chaminés.